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sexta-feira, 2 de março de 2007

A arte em forma de grito

A arte dispensa favoritismo. Quando bebo Van Gogh me emociono. Entre outro gole, passo para Gauguin, e fico sem palavras. O mesmo acontece com Cézanne e Kirchner. Mas é com Edvard Munch que meu espírito se embriaga.

Nenhum outro pintor expressou de forma tão simbólica e subjetiva os sentimentos humanos.

A dor, a angústia, a solidão, a separação, o medo, o amor, o desespero, a dificuldade de viver. Munch fala da alma, na alma, para a alma. As linhas de Munch são inflexíveis ao expressar o sentimento humano.

Banhados por tristes e angustiantes representações, seus quadros e obras gráficas abriram caminho para o desenvolvimento do Expressionismo. Poucos artistas se retratam de forma tão fria e intensa quanto ele.

As composições concebidas por Munch colocaram-no na fronteira da inteligibilidade artística. Em O 'Grito', Munch mostra uma angustia interior descomunal. Não é só a personagem central que grita. Toda a natureza, todo o universo ao seu redor é um grito de desespero. O próprio Munch, na referência escrita que deixou sobre a obra, falava num grito da natureza:

"Passeava pela estrada com dois amigos, olhando o pôr-do-sol, quando o céu de repente se tornou vermelho como sangue. Parei, recostei-me na cerca, extremamente cansado - sobre o fjord preto azulado e a cidade estendiam-se sangue e línguas de fogo. Meus amigos foram andando e eu fiquei, tremendo de medo - podia sentir um grito infinito atravessando a natureza".

A essência de toda obra de Munch prima pela necessidade da expressão humana, do eu, do indivíduo em detrimento do perfeito, da arte em detrimento da superficialidade. A arte surge da exposição das verdades mais profundas do artista.

O ponto comum em sua obra é o rompimento com as convenções, a liberdade de poder expressar e viver as mazelas humanas. Munch retratava o mundo em vez de apenas capturá-lo. A obra dele é visceral, quando você o observa não está vendo a imagem de algo superficial, mas sim penetrando nas entranhas do pintor.

Para Munch, a arte era algo muito mais do que simplesmente retratar algo belo, algo perfeito ou estilizado segundo os cânones de beleza e harmonia. A arte era utilizada com arma para lutar e denunciar situações anómalas e de descontentamento e que se verificam na sociedade. Grande parte de sua obra revela a pessoa aprisionada dentro de si mesmo e que o mundo nunca chegou verdadeiramente a conhecer.

Em uma espécie de manifesto ele escreveu:

Queremos mais do que uma mera fotografia da natureza. Não queremos pintar quadros bonitos para serem pendurados nas paredes das salas de visitas. Queremos criar uma arte que dê algo à humanidade, ou ao menos assentar suas fundações. Uma arte que atraia a atenção e absorva. Uma arte criada no âmago do coração”.

Desse modo, o artista não deve pintar realisticamente, mas sim exprimir e recriar a expressão de maneira encarar, a desnudar e literalmente GRITAR seu universo subjetivo.